Debates sobre audiência: A ascensão do VoD e o Futuro da TV

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A audiência da internet avança a cada ano e o crescimento na área de vídeo on demand está mexendo com a zona de conforto da TV. Destino tradicional das maiores verbas de publicidade, a TV brasileira sente o impacto da internet em seus negócios a cada ano que passa. Seja por conta dos inúmeras plataformas de VoD disponíveis atualmente ou pelas diversas outras mídias que disputam a atenção do público. O consumidor está exposto a tantas mídias, que ele pode ser definido de diversas maneiras: ouvinte, espectador, leitor, usuário e até mesmo jogador.

Audiência na Internet: quem ganha essa briga? VoD ou TV?

Evolução da Audiência da TV no Brasil
Gráfico retirado do artigo: O impacto das mídias digitais na televisão brasileira: queda da audiência e aumento do faturamento. Média de audiência das cinco principais emissoras brasileiras ao longo de 14 anos.

O impacto disso na TV ocorre tanto nos números de audiência, que apresentam tendência de queda há algum tempo, quanto nas receitas publicitárias. Cada vez mais, a TV observa empresas digitais tendo sucesso com a audiência online e ganhando dinheiro com publicidade e Branded Content. Apesar do impacto nas receitas das emissoras ainda não ser tão grande, o cenário que está se desenhando para os próximos anos não é tão promissor para o modelo de negócio atual da TV aberta. São oponentes importantes desde as séries prime da NETFLIX, até os canais do YouTube criados por usuários que conseguem arrastar multidões de fãs.

O mercado de TV vai precisar quebrar alguns paradigmas para sair da zona de conforto. Ao fazer isso, abrirá um espaço interessante para uma necessária renovação, trazendo novidades que poderão chamar a atenção da sua audiência. Não há escapatória. Vivemos um tempo de mudanças e adaptações. Todos precisarão se reinventar.

Uma nova Televisão.

Serviços on demand ganham cada vez mais audiência na internet
Serviços on demand ganham cada vez mais audiência na internet

Os serviços de VoD estão cada vez mais diversificados e sua penetração no público aumenta a cada ano. De acordo com os dados apresentados pela ANCINE no painel que abordou a regulação do mercado de VoD no Rio Content Market de 2016, 38% da população dos EUA possui acesso a algum serviço de VoD. Por lá já existem mais de 200 players de VoD, que movimentaram US$ 521 milhões de dólares em receitas publicitárias entre 2009 e 2015. Lembrando que nessa conta não entra o dinheiro ganho com as assinaturas. Esse número corresponde apenas a receita publicitária.

No Brasil são cerca de 30 players de VoD, que arrecadaram US$ 504 milhões de dólares, remetendo boa parte dessas receitas às suas matrizes no exterior. Segundo o YouTube, que é o maior destino de vídeo digital do planeta, a audiência de vídeo online vai superar a audiência da TV até o final do ano de 2020. E ainda há mais espaço para crescimento do VoD, uma vez que nem toda a população possui acesso à internet de banda larga.

YouTube: A nova fábrica de celebridades.

YouTube - os reis da audiência na internet

O YouTube, em especial, provou que a democratização da produção do conteúdo é benéfica para o setor audiovisual. O modelo de negócio da plataforma é muito sólido. As receitas publicitárias são divididas com os produtores do conteúdo, que recebem uma porcentagem de todos os anúncios que são exibidos em seus canais. Além disso, o produtor continua sendo dono do conteúdo. Não há cessão de direitos autorais para a plataforma. Inclusive, o sistema protege os direitos do dono do conteúdo. Os produtores são livres para vender seu conteúdo para outras mídias. Foi o que o Porta dos Fundos fez com a FOX, por exemplo.

Nos últimos anos presenciamos a ascensão das MultiChannel Networks. Tratam-se de redes de canais do YouTube que se reúnem para conseguir vender mídia a preços mais elevados, aumentando sua receita. Existem várias MCNs no mercado. Uma das pioneiras é a FullScreen, criada em 2011 por George Strompolos. George é um dos criadores do programa de parcerias do YouTube. A FullScreen, assim como outras MCNs, está se tornando uma verdadeira fábrica de celebridades. As MCNs estão pavimentando o terreno para se tornarem as grandes empresas de mídia do futuro.

Distribuição e BigData: duas grandes vantagens do meio digital.

Big Data

No meio digital o gargalo não está no tempo de grade ou na oferta de canais, mas sim em questões relacionadas ao armazenamento e à transferência de dados para a casa dos usuários. Plataformas como YouTube e NETFLIX podem oferecer muito mais variedade de programação do que é possível viabilizar na TV, o que abre as portas para uma audiência global e extremamente diversificada.

O comportamento dos usuários desses serviços é totalmente registrado nos servidores dos provedores na medida em que eles vão consumindo os programas, filmes e séries disponíveis. Aqui chegamos no segundo ponto onde o meio digital é mais eficaz do que a TV: a medição de audiência. A NETFLIX, por exemplo, sabe exatamente quantas séries você viu, quais episódios foram assistidos, quantas horas por semana você acessa o serviço, quantos minutos de determinado episódio você assistiu e por aí vai.

Eles sabem exatamente quantos assinantes possuem e qual a frequência com que eles acessam o serviço. Não estamos falando de dados coletados por amostragem, como o IBOPE faz para a TV. Não se tratam de estimativas de consumo. Estamos falando de números absolutos coletados em tempo real e armazenados em grandes quantidades, abrindo o campo para as análises de BigData. Isso é uma tremenda vantagem competitiva. Já falamos mais detalhadamente sobre esse assunto por aqui neste artigo.

Identificando as demandas da audiência no VoD.

Business Intelligence é um diferencial para a audiência na internet
Business Intelligence é um diferencial para a audiência na internet

A lista de dados de consumo é enorme e ela pode oferecer informações extremamente precisas sobre as demandas da audiência. A NETFLIX sabia que se colocasse Wagner Moura como protagonista de uma série policial com José Padilha na direção, teria uma grande chance de sucesso. E assim nasceu Narcos. Como eles sabiam disso? Põe essa previsão na conta do BigData. Dados de consumo de vídeo na plataforma apontavam para uma demanda por série policial com tais características.

Já parou pra pensar naquela velha frase do Chacrinha? “Na TV nada se cria, tudo se copia”. O velho guerreiro sabia das coisas. Produzir conteúdo para TV é uma atividade que exige muito dinheiro e habilidade para se trabalhar com equipes grandes e multidisciplinares. Não é à toa que os executivos dessa área são mais conservadores e procuram apostar na produção de conteúdos que já tenham histórico de sucesso. O mercado de formatos é a maior prova disso. Num ambiente desses, onde os indicadores de consumo são produzidos por amostragem, é muito mais difícil acertar as demandas da audiência. Exige um investimento alto em pesquisa. Por isso que quando algum produtor acerta uma demanda do público, todos os outros correm atrás.

Ao usar BigData para tentar prever demandas do público, os VoDs se colocam numa posição muito privilegiada em relação à TV. Os dados de amostragem não representam perfeitamente a realidade de consumo. Além disso, a TV possui um número infinitamente menor de dados para analisar, colocando sobre o ombro dos executivos dos canais a responsabilidade de conhecer perfeitamente as demandas de seu público para não investir grandes volumes de dinheiro em projetos que irão fracassar.

Atualmente o YouTube é a plataforma da inovação audiovisual, abrindo espaço para qualquer pessoa publicar seu conteúdo. Uma verdadeira locadora com prateleiras infinitas de vídeos gratuitos. Um viva para a não linearidade! No outro front, dos conteúdos produzidos em alta qualidade, provedores de VoD como NETFLIX e Amazon Prime investem pesado em produção de originais e, graças ao BigData, eles estão acertando cada vez mais seus projetos. Em resumo, os estúdios digitais possuem mais abrangência de audiência e eles conhecem seus consumidores em níveis de detalhe nunca antes imaginados por executivos de televisão.

A internet fora dos bastidores da TV.

Então podemos dizer que a TV está com os dias contados e que é só uma questão de tempo até o VoD e outras plataformas digitais engolirem essa mídia tradicional? Claro que não! A TV não vai deixar de existir por conta da Internet, assim como o rádio não deixou de existir quando a TV surgiu. O que podemos esperar num futuro próximo é a adaptação dessas mídias ao novo cenário.

Recursos como Interatividade e Segunda Tela vão ganhar cada vez mais espaço. Técnicas de Transmídia e Gamificação podem surgir como diferenciais interessantes para os conteúdos de entretenimento. Também fala-se muito no potencial da TV para as transmissões ao vivo, como eventos esportivos e transmissões jornalísticas. E isso é um fato já comprovado há tempos.

Assim como a Internet fez um movimento agressivo em direção ao mercado de TV, o contrário também deve ocorrer em algum momento. Já podemos observar um esforço dos canais em aumentarem a presença digital de seus conteúdos audiovisuais. Seja em plataformas proprietárias de VoD, ou em programas que possuem estratégias específicas para redes sociais, estimulando sua audiência a participar do conteúdo. Isso forma uma narrativa não-linear que impacta o espectador em diversas mídias.

Também existem formatos de programas que incluíram a interatividade digital em suas mecânicas principais. Nesses casos, a relação da TV com a Internet é parte fundamental do programa. Cases de sucesso nessa área podem alavancar a produção de programas com interatividade em tempo real apoiadas por plataformas de internet, sejam elas redes sociais, aplicativos ou comunidades próprias.

A segunda-tela e a criação de comunidades ao redor do conteúdo são possibilidades ainda pouco exploradas pela TV. As pessoas vão se engajar em sites que ofereçam uma experiência mais completa e diretamente relacionada com o conteúdo da TV, em vez de apenas se cadastrarem para receberem notícias, fotos e vídeos dos programas.

Existe muito espaço para inovação nesse cenário de convergência entre Internet e Televisão. O futuro promete ser bastante interessante. Para isso, os conteúdos de internet para programas de TV vão precisar sair dos bastidores, ganhando um papel central nas narrativas televisivas.


Referência:

Lemos de Souza Filho, Guido, Becker, Valdecir, Gambaro, Daniel, O impacto das mídias digitais na televisão brasileira: queda da audiência e aumento do faturamento Palabra Clave [en linea] 2015, 18 (Junio-Sin mes) : [Fecha de consulta: 20 de febrero de 2017] Disponible en:<http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=64938493003> ISSN 0122-8285

 

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