Quem precisa de Cultura?

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Trabalhar com cultura no Brasil não é para os fracos. Toda vez que surge uma notícia negativa relacionada ao setor cultural, observamos o surgimento de um volume muito grande de críticas ácidas sobre o trabalho de quem atua com arte e sobre a razão de ser da atividade cultural. Como se já não bastasse a própria natureza negativa da notícia.

Esses críticos, muitas vezes meros replicantes de opiniões prontas, tem seus argumentos baseados em discursos de ódio ou em um profundo desconhecimento do funcionamento do mercado cultural.

Apesar disso, muitas dessas pessoas continuam espalhando sua visão rasa e maniqueísta sem nenhum interesse em saber mais sobre o assunto. É fácil constatar que esses indivíduos seriam os maiores beneficiados pelo consumo de cultura. Criticam aquilo que não têm.

Consumir cultura é estar em contato com visões diferentes de mundo. É ver pelos olhos dos outros. É experimentar sensações novas por meio de obras realizadas por pessoas que dedicaram sua vida à difícil tarefa de materializar a subjetividade da nossa existência.

É a cultura que oferece ao indivíduo uma visão mais ampla sobre a sociedade onde ele está inserido e sobre o seu próprio papel nela. É a cultura que ajuda a transformar vidas trazendo motivação e inspiração para que os mais diversos tipos de pessoas consigam enfrentar os grandes desafios do mundo moderno.

É a cultura que leva autoestima para quem está sendo subjugado. É a cultura que embala, entretém e diverte crianças, jovens, adultos e idosos. É a cultura que ajuda a colocar um sorriso no rosto de uma criança que passa pelo tratamento de quimioterapia. É a cultura que leva motivação pra quem já não vê mais graça na vida. Não é o mercado.

Felizmente, muitas empresas já entenderam a importância do setor para o nosso país e passaram a fazer parte dele ao patrocinar iniciativas culturais. Grandes companhias possuem departamentos dedicados à responsabilidade social, que além de investir em cultura, também aplicam seus recursos no fomento ao esporte, a educação e aos temas de carácter ambiental.

A própria legislação brasileira para o setor trouxe grandes avanços na produção e distribuição de bens culturais, colaborando para um país mais plural, aberto ao debate e a troca de experiências. O setor audiovisual atualmente é muito dependente desses mecanismos de fomento. É por meio deles que os produtores conseguem se aproximar dos anunciantes e do Fundo Setorial do Audiovisual em busca de financiamento para suas iniciativas.

Quem acompanha o mercado audiovisual brasileiro sabe que nos últimos dias o embate entre a ANCINE e o TCU está dando o que falar. De acordo com o acórdão do Tribunal de Contas da União, emitido no último dia 27 de Março, sobre a metodologia de prestação de contas elaborada pela ANCINE em conjunto com a CGU, sob o olhar do próprio TCU, a atividade audiovisual que se apoia no fomento público está suspensa até que essa metodologia seja revista.

Se levada ao pé da letra, a decisão é um decreto de falência para dezenas de empresas que atuam no setor audiovisual. O impacto na economia será evidente, freando o desenvolvimento de um setor da cultura que cresce cerca de 8% ao ano desde 2012 e aumentando ainda mais o número de desempregados.

O audiovisual no Brasil evoluiu muito, mas ainda está longe de se tornar uma indústria sólida. Estamos muito vulneráveis a mudanças de governos e a interpretações diferentes sobre os processos de fomento e a legislação. Isso inviabiliza o planejamento para que as empresas consigam se estruturar, traçando planos anuais de ação e gerando mais renda e emprego.

Todo o audiovisual brasileiro aguarda com ansiedade a solução desse imbróglio, enquanto os ataques ao setor chegam de vários lados. Inclusive daqueles que mais precisam de cultura.

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